29 de dezembro de 2006

A Razão da Reflexão

reflexão
Estamos naquela altura em que muito boa gente aproveita para fazer uma reflexão sobre aquilo que fez nos últimos doze meses. Uma espécie de post mortem de curto prazo da sua existência. Confesso que não percebo este fascínio da reflexão. É como fazer a autópsia de um tipo que tenha sido atropelado por um camião de oito rodados: sabemos que o indivíduo está morto e que as probabilidades de este continuar a descontar para o IRS são muito reduzidas (felizardo!); portanto é-nos perfeitamente indiferente se a sua morte se deveu a uma perfuração dos pulmões ou se simplesmente o cérebro deixou de funcionar depois de ter experienciado oito toneladas a passar-lhe por cima. Por mais autópsias que lhe façam o resultado final é que o tipo já não cantará a Traviatta, por mais que lhe apeteça. É como as reflexões de fim de ano. Por mais que a malta reflicta, o ano passou e já não volta. Por mais que isso vos custe, é a pura das verdades.
Se querem reflectir sobre a vossa existência não o façam agora, façam-nos todos os dias. A melhor altura para uma reflexão existencial são as manhãs. Vocês acordam, meio estremunhados, cabelo desgrenhado, com um hálito desgraçado, e vão para a casa de banho olhar para a vossa reflexão no espelho. Se depois desta experiência ainda acharem que a vossa existência vale a pena, então continuem, diariamente, a fazer este tipo de reflexão. Para aqueles que não gostam de uma reflexão tão crua, recomendo a reflexão de vitrine: a reflexão de vitrine serve para todos os que não aguentam a reflexão matinal. Consiste em reflectir na montra do banco mais próximo de casa. Tem a vantagem de não se toparem as imperfeições na pele, nem as rugas de expressão, nem os pontos negros. O que não quer dizer que não estejam lá. Mas que se lixe, é apenas uma reflexão.


Para todos os que reflectiram neste último minuto comigo (a olhar para a vossa reflexão no écran do vosso PC), votos de um grande 2007. Perguntar-me-ão se grande implicará que o ano tenha mais dias. Responder-vos-ei que, tal como as reflexões, o ano tem os dias que quisermos. Sejam felizes.

21 de dezembro de 2006

A Razão da Linha do Norte

linha do norte
O Tribunal de Contas produziu recentemente um relatório sobre a modernização da linha dos Caminhos de Ferro do Norte, obra da REFER que dura há 10 anos e cuja conclusão não está à vista.
No relatório do TC vemos que até hoje foram GASTOS mil milhões de euros, ou seja, mais 20% do que estava inicialmente estimado para esta obra. Por aqui podemos ver que as comissões encapotadas já ultrapassaram em muito os 10% habituais...
O relatório revela ainda que existiram empreitadas que foram adjudicadas depois de terem sido realizadas (?), e que se teriam poupado quinze milhões de euros se tivessem sido escolhidas as propostas mais competitivas.
O relatório do Tribunal de Contas revela, em suma, a incapacidade e falta de transparência da REFER nesta obra pública, realizada (como outras tantas) à custa dos contribuintes.
Mas a parte mais divertida do relatório está na sua conclusão: nela, o Tribunal de Contas recomenda que, de futuro, a REFER controle melhor os seus custos.
Mas que merda de conclusão é esta? É para isto que serve um relatório do Tribunal de Contas? Então estes gajos concluem que a malta da REFER anda a roubar à grande e à francesa nos últimos dez anos e a única coisa que fazem é dizer para os meninos terem mais cuidado a roubar?? E que tal demitirem toda a administração da REFER? E que tal prendê-los por gestão danosa de dinheiros públicos? E que tal contratar uma tribo somali fresquinha para alargar o esfíncter de cada membro do conselho de administração?

20 de dezembro de 2006

A Razão dos Lambe-Cus


A humanidade divide-se em dois géneros, para além dos meninos e das meninas: há os lambe-cus, e há aqueles cujas papilas gustativas não toleram o confronto sensorial directo com o streptococus vulgaris. A divisão não é equitativa. Os lambe-cus são, nitidamente, a maioria vigente.
Está veladamente convencionado nesta sociedade que «lamber um cu diariamente, garante um futuro polivalente». É uma forma de investimento a prazo.
Quem lambe um cu está convencido que, embora o sabor não seja nada por aí além, a coisa vale o esforço que daí advém. O cu lambido é normalmente grato, e o acto de lambecuzice raramente fica em cu alheio.
É importante referir que, para quem lambe cus, é perfeitamente indiferente o cu que está a lamber. É uma questão de fé que roça os critérios dos apostadores de cavalos: só se lambe um cu porque se tem fé que esse cu vale a pena lamber, porque vai dar algo a ganhar.
Lamber cus é um acto de fé completamente enviezado. Daí que seja extremamente fácil desatar a lamber outro cu qualquer, por dá cá aquela palha.
Para o lambe-cus, paradoxalmente, o importante não é lamber um cu em particular. É a aleatoriedade da coisa que dá riqueza ao acto e que aumenta a possibilidade de, um dia, deixar de lamber cus para ter o seu próprio cu lambido. Daí que se lambam cus de muitos quadrantes e de variadas influências. O cu é uma lotaria. Nunca se sabe ao certo qual é o que dá prémio. Portanto o lema é lamber indiscriminadamente.
É por essas e por outras que existe aquele ditado: «Quem tem cu tem medo». E se não tem, devia ter.

16 de dezembro de 2006

A Razão Tipo Serra

tipo serra
Tipo é uma daquelas palavras da treta a que é preciso prestar atenção. Sempre que virem a palavra «tipo» anexada a outra palavra qualquer, alguém vos está a aldrabar. «Charcutaria do tipo nova-iorquino?». Sabem porque lhe chamam isto? Porque não fica em Nova Iorque. É só por isso. Provavelmente, fica em Kekanal no Egipto, o dono é do Ruanda e a comida sabe a qualquer coisa que os Hutus dariam aos Tutsis para comer.
Outro uso da palavra «tipo» pode ser encontrada em «restaurantes do tipo familiar». O que quer dizer é que, em cada mesa, há gente a discutir. E o filho mais velho anda a espancar mulheres. É uma coisa de «tipo familiar», percebem?

George Carlin

13 de dezembro de 2006

A Razão da Biografia Precoce


Confesso que nunca liguei muito às biografias como obras literárias. Nunca tive grande interesse em saber da vida dos outros, mesmo que estes fossem remotamente famosos ou que tivessem sido vagamente influentes no mundo. Acho que o interesse por uma biografia, qualquer que ela seja, não é muito diferente de encher as audiências de um canal que passe um Big Brother ou outro reality show qualquer. Com uma nuance: as biografias não têm metade da javardice porcalhota de um reality show. Normalmente contam-se sempre as partes dignas da vida de um dado indivíduo.

Sempre achei que a biografia era algo posterior à extrema unção: nunca me fez grande sentido uma biografia ser escrita enquanto o indivíduo ainda estava vivo. São uma espécie de morte antecipada por indivíduos que, se não estão fisicamente mortos, estão-no certamente a nivel social ou político. É o caso da Carolina do alterne e do Santana sem alternativas. Esta mania nacional recente de se publicarem livros a explicar que «se a minha avó tivesse rodas seria um camião de oito rodados» é, no mínimo, reveladora de uma pobreza intelectual incapaz de avaliar o rídiculo de todo o esforço editorial que tiveram para publicar aquelas verdadeiras bostas. Podemos tirar a mulher do alterne e o homem da politiquice, mas infelizmente não podemos tirar o alterne da mulher nem a politiquice do homem.

12 de dezembro de 2006

A Razão do Mau Ambiente

mau ambiente
Se há um movimento mundial (para além dos escoteiros) que acho perfeitamente inconsequente é o Greenpeace. Na minha opinião o Greenpeace não passa de um grupo de putos malucos à procura de protagonismo radical e novas emoções, financiados por empresários nada malucos. Aliás, foi o Greenpeace que inventou o protagonismo radical e que tornou obsoletos os 15 minutos de fama que Andy Warhol vaticinou para o resto da humanidade. É que, no Greenpeace, qualquer um consegue ter 16 minutos de fama, antes de ser arpoado ao tentar defender uma baleia azul, ou sodomizado por uma tribo somali enquanto tenta evitar a extinção do papa-formigas de testículos dourados.
Se esta malta estivesse realmente interessada em defender o ambiente, instalaria o seu quartel general em Portugal. Não porque os portugueses são uns alarves a cumprir os objectivos de Quioto. Não porque os portugueses estragam, ano após ano, o seu próprio ambiente. Mas simplesmente porque este país TEM mau ambiente.
O Estado português é o grande causador deste mau ambiente e, no entanto, não vejo nenhum membro do Greenpeace a dar azo à sua histeria de protagonismo numa qualquer repartição de finanças deste país. A maioria das empresas portuguesas têm mau ambiente, mas não é por isso que vemos os putos malucos do Greenpeace a invadir as suas entradas com os seus destemidos barcos de borracha.
Isto não passa tudo de uma fantochada encenada em destinos turísticos inexplorados (e lindos) que, se não fosse financiada por lobbies insuspeitos, nunca seriam visitados por chavalos munta malukos e radikais, à procura deles próprios.

7 de dezembro de 2006

A Razão do Décimo Terceiro

décimo terceiro
Dezembro em Portugal é um lampejo daquilo que seria o país se a sua população ganhasse o dobro do seu ordenado mensal. Excitados e em frenesim com o décimo terceiro mês, os portugueses entopem portagens, atestam o depósito de combustível, invadem pastelarias, restaurantes e bares, atafulham centros comerciais, alongam filas de trânsito, preenchem milimetricamente parques de estacionamento, lotam cinemas, atropelam-se febrilmente em hipermercados, e compram, compram como se não houvesse amanhã, tudo o que lhes aparece à frente. Com os cartões de crédito incandescentes e a cheirar a plástico queimado, os portugueses com o décimo terceiro mês no bolso tornam a vida neste país num autêntico circo alucinado de consumo. Imaginem se tivéssemos o nível de vida da nossa vizinha Espanha: seria isto todos os meses do ano! Um verdadeiro inferno.

Não estamos estruturalmente preparados para ganharmos o dobro do que ganhamos agora. Chego à conclusão que não temos vocação para prosperidades económicas: tratamos rapidamente de lixar o nosso orçamento disponível. Vai ser interessante ver a calmaria de Janeiro. Vai, vai.

6 de dezembro de 2006

A Razão do Homo Sapiens Sapiens

homo sapiens sapiens
Há um pequeno planeta azul na órbita do Sol, e este planeta é gerido por um monte de macacos. No entanto os macacos não se vêem a si mesmos como macacos, aliás nem se vêem a eles próprios como animais. Na realidade eles até gostam de listar todas aquelas coisas que os separam dos animais: polegares oponíveis, auto-consciência, e uso de palavras como «Homo Erectus», ou «Australopitecos». Mas, na verdade, não passam mesmo de macacos. Macacos com tecnologia de fibra óptica digital, mas ainda assim macacos. São inteligentes, é preciso reconhecê-lo: as pirâmides, os arranha-céus, os aviões a jacto, a grande muralha da China, tudo isto são merdas bastante impressionantes para um monte de macacos. Macacos cujos cérebros evoluíram para um tamanho tão inimaginável que torna completamente impossível a sua felicidade durante um período mais ou menos alargado. Aliás, eles são o único animal do pequeno planeta azul que acha deve ser feliz, quando todos os outros animais podem apenas Ser. Mas isto não é tão simples para os macacos. Os macacos estão amaldiçoados pela sua Consciência. A sua Consciência faz com que os macacos tenham medo. Então os macacos ficam preocupados. Os macacos preocupam-se com tudo, mas preocupam-se especialmente com tudo o que todos os outros macacos pensam. Porque os macacos querem desesperadamente pertencer a alguma coisa que os outros macacos pertençam. Isto é difícil de conseguir, porque a maior parte dos macacos odeia os outros macacos. O que realmente os separa dos outros animais é o seu ódio. Odeiam macacos que são diferentes de si, macacos que vivem noutros sítios, macacos de cor diferente da sua. No fundo, os macacos sentem-se sozinhos. Todos os 6 mil milhões de macacos sentem-se diariamente sozinhos.
Alguns dos macacos pagam a outro macaco para este ouvir os seus problemas. Os macacos querem respostas. Os macacos não querem morrer e então inventam Deuses e adoram-nos. E a dada altura os macacos começam a discutir sobre qual «deus-inventado» é o melhor, algo que deixa os macacos realmente irritados e então decidem que é uma boa altura para começarem a matar-se uns aos outros. Os macacos fazem guerras, os macacos produzem bombas de hidrogénio, os macacos têm o seu planetazinho azul todo armadilhado para explodir a qualquer momento. Os macacos não conseguem evitar ser assim.
Alguns dos macacos tocam instrumentos para multidões de macacos que pagaram para os ouvir tocar os instrumentos. Os macacos criam troféus e depois oferecem-nos entre si, como se estes significassem alguma coisa.
Alguns dos macacos pensam que já perceberam tudo. Alguns dos macacos lêem Nietzsche, alguns dos macacos elocubram em torno de Nietzsche sem terem em qualquer consideração o facto de Nietzsche ser apenas mais um sacana de um macaco. Os macacos fazem planos. Os macacos apaixonam-se. Os macacos fodem. E fazem mais macacos. Os macacos fazem música e então os macacos dançam. DANCEM MACACOS, DANCEM!
Estes macacos são simultaneamente as criaturas mais horríveis e mais belas do seu planeta azul. Mas os macacos não querem ser macacos, querem ser outra coisa. Mas não são.


Tradução e adaptação selvagem de um poema de Ernie Cline

5 de dezembro de 2006

A Razão da Opinião Pública

opinião pública
Para mim a Opinião Pública é como a plasticina: com imensas cores diferentes e perfeitamente moldável.

Tem um problema também semelhante à plasticina - quando misturamos as várias cores e moldamos excessivamente, fica acinzentada.

4 de dezembro de 2006

A Razão dos Três Porquinhos


3 porquinhos

O conto infantil que melhor retrata a história da humanidade é, sem dúvida, a História dos Três Porquinhos. Esta história simbolicamente divide o mundo em 4 tipos de gente, cada um dos tipos correspondendo a uma personagem:

- Temos os indigentes, representados por Cícero (o porco preguiçoso), que gostam pouco de alancar e preferem esticar a mão ao fim do mês e receber os subsídios do Estado.

- Temos os tipos que trabalham, trabalham e trabalham, representados por Heitor (o porco trabalhador), que nunca têm o seu esforço recompensado e que no final de cada mês vêem o seu dinheirinho escoar-se em impostos para pagar a inércia dos Cíceros deste mundo.

- Temos a malta inteligente, representada por Práctico (o porco construtor civil) que lá se vai safando com algum custo.

- E finalmente temos os gajos que querem lixar a vida a todos os outros (representados pelo Lobo Mau) e que, trabalhando afincadamente para o Estado (essa abstracção incómoda) acabam inevitavelmente por lixar os Cíceros e Heitores da vida.

O conto contém requintes de malvadez: as personagens consideradas «boazinhas» são uma vara de porcos, o que não abona muito a favor de todos nós. Todos têm um nome próprio à excepção do lobo que, tal como o Estado, não é personalizável. Quem é esperto dedica-se à construção civil à séria. E o Estado é representado por um predador insistente e sem escrúpulos (um silogismo, portanto).
A história só não é perfeita porque um dos porcos acaba por se safar à conta de um trabalho bem feito e de uma criteriosa escolha de materiais de construção. É aqui que tudo entra no mundo das fábulas, porque sabemos bem que no mundo real o porco nunca teria este discernimento profissional e veria a sua obra embargada sine die para mais tarde ser implodida com pompa e circunstância ou, na melhor das hipóteses, untava as mãozinhas do lobo e de todos os seus colegas de partido para evitar ser envolvido numa escandaleira qualquer envolvendo práticas esquisitas com leitõezinhos e tâmaras frescas.
Ainda assim fica o registo de uma boa tentativa para nos retratar.

3 de dezembro de 2006

A Razão da Festa de Casamento


festa de casamento
Tenho um problema com as festas de casamento. Primeiro porque não percebo porque raio dois seres acham que o facto de terem decidido viver juntos «para o resto das suas vidas» constitui motivo de celebração, e depois por todos os rituais bacocos que envolvem a festa, e que fazem com que as festas de casamento se assemelhem às bolas de ténis: quem vê uma vê todas. E por isso mesmo, sempre que vou a um casamento é como se estivesse a ver pela enésima vez o mesmo filme, só mudando os locais de filmagem, e claro, as personagens.
Ao longo de anos como convidado de festas de casamento criei uma pequena check list virtual que uso para me entreter e passar o tempo em cada celebração matrimonial. Como o argumento é sempre igual de festa para festa, a check list é dolorosamente implacável a assinalar «os pontos altos» de cada uma.
Não pretendendo ser exaustivo (a minha lista é verdadeiramente longa e diversificada, ombreando com qualquer modelo de análise multivariada) vou partilhar convosco os items mais comuns:

Na Igreja
Para quem conseguiu escapar à gloriosa tarefa de ter que começar a festa a enfardar na casa de um dos noivos antes de o acompanhar no seu trajecto ao altar, a Igreja é o grande início da festa do casamento e apresenta per si um rico manancial de rituais:

- O Freakshow – continuo a achar esta parte a mais interessante porque em cada casamento há sempre uma bela molhada de seres esquisitos (amigos e familiares dos noivos) que nós nunca vimos antes e que dão um colorido peculiar à cerimónia, com os seus fatos a cheirar a naftalina (invariavelmente dois números acima ou abaixo da medida do seu utilizador); os sapatos encerados de modo a encandear toda a tripulação de um boeing que passe por ali perto; os vestidos mais inexplicáveis com decotes e minissaias generosas sustentadas por saltos agulha que dificultam o andar no chão empedrado da igreja. Na fase de freakshow os mamíferos presentes trocam olhares e cochichos, medindo-se timidamente uns aos outros, avaliando as suas respectivas figuras tristes.

- O Sermão e as Leituras – onde por breves momentos toda a gente parece ter o dom da leitura, recitando aqueles repetitivos «discursos de São Paulo aos etruscos», ouvindo-se aqui e ali um choro de criança a ser levada rapidamente para fora da igreja por um dos seus sádicos pais. Se tivermos sorte, o que é raro, o padre é breve e contido e poupa-nos meia hora de seca a falar da incerteza dos dias de hoje, da crise das instituíções e da própria família, e da escassez de crentes praticantes abaixo dos 65 anos.

- O Arroz – o discurso do padre ditará a violência com que se atirará o arroz aos noivos. Se o padre nos deu uma seca, o mais provável é que pelo menos um dos conjuges nunca consiga recuperar totalmente de uma perfuração da retina.

- O Cortejo Automóvel – já vi carrinhas funerárias deslocarem-se mais depressa que um cortejo automóvel num casamento, o que torna a chegada ao Copo D’Água um verdadeiro suplício, principalmente durante a época de Verão. De salientar aqui dois aspectos: os carros estão sempre imaculados e reluzentes; e um grupinho de labregos irá invariavelmente perder-se do cortejo chegando muito depois dos petit fours.

Vou omitir propositadamente a parte das fotografias e das filmagens, porque geralmente não têm grande interesse na altura (embora saibamos que vamos ter de levar com elas mais tarde, quando os noivos chegarem da Lua de Mel).

No Copo D’Água
É considerada a segunda parte do filme, e aquela que apresenta variantes mais ricas. Digamos que a verdadeira festa começa realmente aqui.

- Os Petit Fours – ao chegarmos ao local do Copo D’Água somos presenteados com petit fours e aperitivos vários. Começa assim a verdadeira maratona de bebida e comezaina, havendo alguns convivas que ficarão alegremente etilizados nesta fase em estágio para a verdadeira bebedeira que se desenrolará a seguir, em todo o seu esplendor. Nesta fase o nível de álcool faz com que os convivas comecem a socializar entre si, perdendo alguma inibição inicial.

- O Arremesso do Bouquet – um momento crítico para as encalhadas de serviço a qualquer casamento. Já quentinhas com os aperitivos, este ritual assume um carácter de «vida ou morte» para cada uma das participantes, podendo originar traumatismos graves dependendo do grau de desespero das intervenientes.

- A Refeição Principal – aparte da velocidade com que a comida e a bebida desaparecem nesta fase, pouco há salientar, tirando talvez o ritual do bater em uníssono com um talher no copo, na tentativa de que os noivos se beijem. Existem variantes deste ritual, muito mais interessantes aliás, onde os convivas exigem que o pai da noiva beije violentamente a mãe do noivo (a maior parte das vezes sem qualquer sucesso aparente).

- O Charuto – como fumador habitual de habanos divirto-me a observar os mamíferos do sexo masculino a fumar o tradicional charuto depois da refeição principal. É impressionante a figura urso que se pode fazer a fingir que se sabe fumar charuto. Gosto particularmente do free style de espetar um palito pelo charuto adentro de modo a segurá-lo na boca trincando apenas o palito. São uns artistas.

- O Bailarico – na minha modesta opinião, o ponto mais alto da festa matrimonial. Nesta altura eles e elas perderam a compostura, desapertaram as gravatas, subiram as mangas e as saias, baixaram os decotes e dançam (muitas vezes descalças) como se não houvesse amanhã, fazendo de quando em vez um pequeno comboio de bêbados que circula por entre as mesas do recinto. Valentes trambolhões são coisa normal nesta fase, havendo variantes mais excitantes que envolvem cenas de desenfreada pancadaria entre maridos ciumentos na defesa das suas etilizadas e ziguezagueantes esposas, apalpadas sem dó nem piedade por indivíduos que ultrapassaram, em muito, os limites legais de consumo de substâncias entorpecentes.

- O Cortar do Bolo – é normalmente arrastado até ao último minuto possível por se saber que, depois dele, mais de metade dos convivas baza alarvemente dali para fora. Eu incluído (antes de dar a segunda dentada naquela fatia gigantesca e sensaborona já estou ao volante do carro para me pirar).

- A Ceia e o Pós Ceia – confesso a minha total falta de experiência nesta fase. Mas segundo me dizem é aqui que se inicia o próximo casamento, dado que são normalmente os encalhados que resistem até à Ceia na tentativa de desencalharem de uma vez por todas. A bebedeira normalmente baixa-lhes a fasquia dos critérios o que lhes abre uma possibilidade, mesmo que remota, de encontrarem (no mesmo estado etilizado) a «pessoa do resto das suas vidas».

Da próxima vez que forem a um casamento levem esta pequena lista e confiram. Esqueçam a parte da Ceia, mesmo que estejam encalhados. Mais vale ter critério.

2 de dezembro de 2006

A Razão do Limbo (I)


limbo (I)
O recém chegado Papa Bento XVI convocou, no início do ano, uma comissão de trinta teólogos com o objectivo de acabar com o Limbo. Para quem está menos informado sobre a arquitectura do edificio celeste, o Limbo é aquele andar entre o Céu e o Inferno, para onde vão as almas de todas crianças, bébés e fetos que morrem sem que tenham sido baptizados. O Limbo, que existia desde o século IV, altura em que São Gregório, o Teólogo, decidiu construir uma mezzanine no Inferno, passou a ser levado a sério depois de umas obras de restauro levadas a cabo por São Tomás de Aquino no século XIII, altura em que ganhou um estatuto de assoalhada (muito embora o seu pé direito fosse muito reduzido, dado que foi espaço ganho ao inferno, nunca ninguém se preocupou muito com isso porque as crianças nunca atingiam alturas acima do metro e meio). No início do século passado, o Papa Pio X garantiu a pés juntos que o Limbo existia e que as almas das crianças não baptizadas estavam lá – tendo apresentado na altura vários dossiers com os nomes e idades dos residentes.
A existência do Limbo nunca foi pacífica, dado que era considerada um regime de apartheid celestial: uma criança índia que nascesse e morresse no meio da selva sem nunca ter ouvido a Palavra do Senhor (muitos consideram que essa palavra é «rabanete», embora ninguém esteja muito certo disso, havendo uma escola mais radical que afirma que a palavra é «zingarelho») nunca teria possibilidade de chegar ao Céu, e o mais que podia era candidatar-se a um lugar no Limbo, simplesmente porque o canal de distribuíção da Igreja não fazia entregas naquela zona da sua selva. Uma escandaleira discriminatória, como bem se vê.
Foi exactamente este princípio de apartheid que levou o Papa Bento XVI a rever a existência do Limbo e a iniciar a sua extinção, o que irá tornar as coisas mais complicadas doravante uma vez que, sem o Limbo, os católicos e os membros de uma série de outras religiões irão concorrer em pé de igualdade por vagas nos mesmo lugares – Céu, Inferno e Purgatório. E sabe Deus como estes dois últimos estão lotados...

Entretanto os 30 teólogos estão reunidos à procura de soluções para acabar com o Limbo e realocar aquelas alminhas. Espera-se que na próxima sexta-feira apresentem ao Papa um pacote de medidas, que terei oportunidade de revelar em primeira mão, aqui na Razão.

1 de dezembro de 2006

A Razão da Palavra do Senhor


palavra do senhor
Quando Jesus fez a sua série de workshops com os 12 apóstolos deu-lhes instruções para que, após a sua morte por crucificação, corressem o mundo e difundissem a Palavra do Senhor. Azar dos azares, Jesus nunca conseguiu dar o último módulo do workshop dedicado a «Coisas Que Devemos Dizer Para Arranjar Mais Sócios». Falou-lhes dos Milagres, falou-lhes do Céu & Inferno, falou-lhes na Vida Eterna mas, quando ia falar na Palavra do Senhor, um destacamento de romanos entrou-lhe pelo auditório adentro (o Judas havia-se chibado por não estar de acordo com as propinas do workshop) e levaram-no, e crucificaram-no, e empalaram-no. E finito. O tipo morreu sem dizer concretamente que Palavra era aquela.
Os apóstolos ainda tentaram fazer um brainstorming, com os conhecimentos adquiridos até à data, de modo a conseguirem chegar a algo que se assemelhasse ao que eles achavam que seria a Palavra do Senhor, mas tirando aquela cena da ressuscitação (onde todos estavam de acordo que era uma história do caraças e que merecia ser contada), não conseguiram chegar uma conclusão sobre qual seria a Palavra do Senhor. E assim cada um deles foi à sua vida escrever e pregar sobre a sua visão de Deus e de Jesus, e cada um deles achou que sabia qual era a Palavra do Senhor.
Pedro, João e Tiago (o Maior) achavam que a Palavra do Senhor era «rabanete». Chegaram a esta conclusão depois de terem proferido uma série de outras palavras. Na altura em que proferiram «rabanete» aconteceram umas coisas esquisitas: a terra tremeu, a garrafa de vinho caiu de pé, e os cães começaram a uivar. E a partir daí, desconhecedores da escala de Richter, acharam que tinham descoberto a Palavra.
Filipe, Bartolomeu e Tomé haviam decidido que a Palavra era «Oréops!», mas só porque gostavam da sua sonoridade, dado que não há qualquer registo que algum fenómeno natural tenha ocorrido quando esta foi inicialmente pronunciada. Tomé era aquele que a usava mais, principalmente quando treinava o seu triplo salto encarpado de costas, nas margens do Mar Morto.
Tiago (o Menor), Mateus e Judas Tadeu, eram apologistas fervorosos da Palavra «Porra», a última palavra que ouviram da boca de Jesus. Achavam que não era uma simples interjeição nascida da sua inconfortável posição na cruz. Acreditavam piamente que se aquela foi a última palavra de Jesus, é porque aquilo devia ter um segundo sentido qualquer. Um sentido celestial.

Finalmente, os dois apóstolos mais radicais, André e Simão tinham «zingarelho» como a verdadeira Palavra do Senhor. Tinham-na ouvido da boca de Maria Madalena quando pela primeira vez recorreram aos seus serviços. Ela apontou para as tripas de porco e disse-lhes: «ponham lá os zingarelhos, que isto não é da Joana». Depois dos zingarelhos postos Maria Madalena deu-lhes uma experiência celestial que eles nunca mais esqueceriam. E desde aí a Palavra do Senhor passou a ser um grande «zingarelho». Bem... no caso de Simão nem era tão grande como isso.

30 de novembro de 2006

A Razão da Testemunha


testemunha
Não vos causa estranheza a designação «testemunha presencial»? O que é que isto é suposto definir: um tipo que estava fisicamente presente num local onde se deu uma ocorrência, não? Ora isto significa que quem não estava fisicamente naquele local quando se deu a concorrência é uma «testemunha não presencial». Cheguei à conclusão que sou uma testemunha não presencial de milhares de atrocidades e isso deixa-me preocupado. É que esta condição de testemunha não-presencial coloca-me na eminência de qualquer dia ser intimado a comparecer num qualquer tribunal algures no mundo, para testemunhar não presencialmente um crime qualquer, o que convenhamos não dá muito jeito, principalmente se tiver que fazer várias escalas.
A outra designação dúbia é «testemunha ocular». Isto supostamente define alguém que é uma testemunha presencial e que ainda por cima viu tudo o que se passou em determinada ocorrência. Ser «testemunha presencial» não é o mesmo que ser «testemunha ocular»? Ou também há «testemunhas auriculares»? Curiosamente nunca ouvi ninguém falar nas testemunhas auriculares, aqueles tipos que estão no lugar da ocorrência mas que por qualquer motivo não olham para ela. Não olham, pronto. Não gostam de olhar para aquelas porcarias. Mas ouvem. Ouvem tudo. Não serão estes gajos testemunhas auriculares?
Isto leva-me a pensar que podem existir «testemunhas não presenciais auriculares»: tipos que estão longe da ocorrência mas que conseguem ouvi-la. Esses tipos são considerados legítimos? Mesmo que o pai seja incógnito? Não faço ideia.
Mas onde a coisa se baralha mesmo é com aqueles gajos que estão longe da ocorrência e no entanto estão a olhar para ela com um par de binóculos. São as «testemunhas binoculares». Estes nem são presenciais nem auriculares (porque estão longe demais para ouvir o que quer que seja). Poderão estes gajos ser levados a sério num tribunal? Espero bem que não. É que eu todas as noites sou testemunha binocular das excêntricas actividades nocturnas de uma vizinha jeitosa, e não me dá jeito nenhum ir parar a um tribunal.

29 de novembro de 2006

A Razão do Reality Show


reality shows
Há uns tempos atrás o Zé Maria, aquela alma simples do Big Brother, tentou suicidar-se, depois de ter estoirado o dinheiro que ganhou no concurso em projectos falhados.
Marco, o neanderthal do pontapé maravilha do Big Brother, foi detido pela polícia no ano passado, acusado por um camionista de agressão selvática e persistente numa fila de trânsito.
A semana passada li que o Mário, o loiro burro do Big Brother, foi preso pela judiciária, acusado de liderar um gang responsável por assaltos à mão armada na zona do Porto.
A julgar pelos exemplos acima, os reality shows serão largamente responsáveis por toda uma geração de anormais desajustados e destrambelhados, com a mania das grandezas e do sucesso fácil. Não falo só dos anormais que por lá pululam, mas também dos anormais que diariamente enchem as audiências deste tipo de programas.
Parece-me óbvio que os reality shows dão cabo da vida pública dos seus participantes, que consequentemente passam a lidar muito mal com isso nas suas vidas privadas. Ora se assim é, porque não assumir as coisas frontalmente e criar programas que arrebentam com a vida dos gajos logo ali em directo, à vista de toda a gente, em vez dos abandonar à sua sorte no fim de cada programa? Seria infinitamente mais honesto do que acontece agora. E geraria muito mais audiência.
Foi a pensar nisto que elaborei algumas ideias passíveis de serem utilizadas pelo Piet Hein, free of charge, nos seus futuros lixos televisivos:

O Atol
Um grupo de labregos é colocado num atol de Mururoa. São formadas equipas de dois elementos e a cada indivíduo é dado um componente de uma bomba nuclear de potência desconhecida. Cada elemento da equipa é colocado num ponto do atol, bem distante do seu companheiro de equipa. O objectivo é encontrarem-se o mais rapidamente possível, juntando os componentes da bomba e accionando o dispositivo. Vence quem conseguir destruir o atol primeiro. Prémio de 100.000 euros para os primeiros, que será doado à TVI se os participantes não se apresentarem nos escritórios do Piet Hein duas horas depois de finalizada a prova.

A Tribo
Um grupo de quarentonas encalhadas é largado na selva ardente à mercê de uma tribo de somalis devidamente untadinhos e com a testosterona alterada quimicamente de modo a não pensarem noutra coisa que não seja a sodomia brutal e persistente.
Ao fim de três meses as quarentonas serão recolhidas e a vencedora será aquela que ostentar um caminhar mais esquisito.

A Catapulta
Um reality show com anões, cavalos pentapérnicos, e mulheres desnudas, que tem características próximas do triatlo olímpico.
Os anões são inicialmente catapultados para dentro de campos de minas, que terão que atravessar até chegar aos cavalos pentapérnicos. Os que sobreviverem à queda e às minas terão que cavalgar 20 km num campo de urtigas e espinhos, agarrados à quinta perna do cavalo. Os que conseguirem transpôr a segunda fase da prova serão de novo catapultados para o campo de minas. As mulheres desnudas na realidade não existem, e são apenas um motivo para dar cabo dos anões. O anão que sobreviver estará automaticamente apurado para «O Atol».

O Cartoon
Destinado a toda essa malta com talento para o desenho que anda por aí. Doze cartoonistas são fechados numa sala blindada com um fundamentalista islâmico que, embora ninguém saiba porque não se vê, está atestadinho de explosivos na zona rectal. Os cartoonistas têm que desenhar temas religiosos alusivos ao Ramadão. Quem conseguir fazer explodir o árabe ganha umas próteses biónicas (último modelo) para os bracinhos.

A Repartição
Reality show que simula o interior de uma repartição pública. A cada um dos quinze participantes é facultado: uma máquina de escrever Remington de 1916, trinta resmas de papel pautado, cinco resmas de papel químico, uma caixa de lexotans. Vence quem conseguir levar mais tempo a deferir um processo. O premiado será catapultado para o campo de minas dos anões. Os restantes irão servir de figurantes em «O Atol».


28 de novembro de 2006

A Razão da Convenção






Sabemos que um blog só é verdadeiramente um blog quando resiste à barreira dos quatro meses – duração convencionada, por não sei quem, para o fim da maioria dos blogs. É verdade. Sempre que se cria um blog, o mais certo é que a sua esperança de vida seja de quatro meses. Isto significa que a maioria das pessoas só tem quatro meses de coisas para dizer. Pena que isto não aconteça também na política.
Isto para dizer que a Razão entra hoje no seu sexto quarto mês de existência, cumprindo o seu segundo aniversário. Com muito menos para dizer do que há dois anos atrás, é certo. Mas ainda assim com muita barbaridade por escrever. Quanto mais não seja para contrariar a convenção dos quatro meses. Odeio convenções. Aborrecem-me.


Para assinalar o 2ºaniversário do blog, esta semana irá ser dedicada à republicação dos meus posts preferidos do ano que passou. Acabei de dar uma semana de férias a mim próprio. ;-)

27 de novembro de 2006

A Razão dos Bons Velhos Tempos

velhos tempos
Estão a ver aquelas conversinhas que vos aborrecem?
Se há conversinha que me aborrece solenemente é aquela que começa por três palavrinhas: «No meu tempo...» e assim por diante.
Chateia-me o paternalismo enternecedor e cínico de quem já viveu mais tempo do que eu e que por isso acha que sabe infinitamente mais do que nós. A ponto de se achar no direito de começar as suas frases por «no meu tempo...».
Para já há aqui um equívoco espacio-temporal e existencial: aparentemente estes mamíferos acham, ao proferir estas merdas, que estão noutro tempo que não o nosso. O que me parece deveras preocupante. Afinal que merda é essa do «tempo deles»? Este sentimento de posse face a algo tão etéreo e passageiro como o tempo só demonstra que, na minha humilde opinião, qualquer que seja, ou tenha sido, o tempo deles, foi mal empregue. Por uma simples razão: foi erradamente cristalizado, à semelhança dos seus cérebros, provavelmente.
Mas o que me chateia mais é a interpretação que estas alimárias fazem daquele que convencionaram ser «o seu tempo»: no seu tempo era tudo mais difícil, o que os torna nuns heroizinhos da merda noutro tempo que não o deles; no seu tempo os jovens eram mais cultos e interventivos na sociedade; os políticos eram mais idealistas e menos corruptos (que ingenuidade!!); os funcionários públicos eram mais trabalhadores; os professores eram mais severos e eficazes; os pais eram mais responsáveis; as crianças eram menos gordas; os impostos eram mais baixos; o clima era mais ameno; o buraco do ozono era menos esgaçado; o custo de vida era mais acessível; o poder de compra era mais elevado; e o raio que os parta!
Ouvimos o discurso vazio destes gajos e sentimo-nos uns injustiçados por ter de levar diariamente com o José Sócrates, e por não ter a sorte da Madonna vir a Portugal adoptar o Marques Mendes.
Pessoalmente isto aborrece-me. Principalmente porque «no meu tempo» o que eu esperava é que estes gajos que invocam a torto e a direito «o seu tempo» tivessem feito alguma coisa de útil para tornar «o nosso tempo» numa coisa aprazível e, preferencialmente, divertida. Que é exactamente aquilo que me proponho fazer até ao fim do «meu tempo».

26 de novembro de 2006

25 de novembro de 2006

A Razão Realmente Importante

realmente importante
Não perguntes o que podes fazer pelo teu país.
Pergunta antes o que é que há para o jantar?


Orson Welles

23 de novembro de 2006

A Razão do Passeio dos Militares

passeio

Em 25 de Abril de 1974 os militares, insatisfeitos, tomaram o poder.
Hoje os militares, insatisfeitos, «passeiam organizadamente».
Estamos a ficar moles.

21 de novembro de 2006

A Razão de Desenrascar

desenrascar
Os portugueses dividem-se em dois géneros básicos: os enrascados e os desenrascados. Os primeiros dependem dos segundos, e os segundos dependem dos primeiros. É um ciclo vicioso (e viciado) que tem a sua inspiração, provavelmente, em Karl Marx.
Os desenrascados têm como função, ao contrário do que o nome sugere, enrascar os enrascados. Quando o conseguem, podem então fazer jus à sua característica predominante e então desenrascá-los. É ridículo, é La Palisiano, mas é verdade. Maquiavel era capaz de se baralhar no meio deste processo todo: aquela sua velha questão (ou postulado) onde os meios justificam os fins, adquire um carácter meio esquizofrénico aqui em Portugal. É que aqui, para um desenrascado, os meios são mesmo os fins. Enrascar é uma garantia de que vai ser necessário, a qualquer momento, mais tarde ou mais cedo, desenrascar.
Desenrascar, aqui nesta nossa telenovela mexicana, significa resolver um problema que não existiria se não tivéssemos pensado em qualquer coisa que nos pudesse enrascar. Passo a explicar:
Alberto tem uma máquina de lavar roupa. A máquina de lavar roupa tem um painel electrónico. O painel electrónico da máquina de lavar roupa de Alberto diz que já é altura de verificar o nível de calcário da máquina. Alberto liga para um canalizador para o desenrascar (pensa ele). O canalizador chega, abre a máquina de lavar roupa do Alberto, e enrasca-o. Uma semana depois a máquina, que está programada para electronicamente pedir uma revisão ao fim de um ano, deixa de funcionar. Alberto volta a ligar para o canalizador que o enrascou e pede-lhe para o desenrascar. É assim a vida neste país à beira-mar enrascado.
O problema é que este comportamento se repete nas mínimas coisas: votamos, enrascados numa crise económica causada em grande parte pelo partido que ganha eleições, para nos desenrascarmos e ainda nos enrascamos mais.
Ser português é andar à rasca e à espera que alguém o desenrasque. Há aqui uma espécie de demissão de responsabilidade a favor de alguém que ainda é mais irresponsável que nós. Fantástico, não é?
E acabei agora mesmo de desenrascar o post de hoje. Amanhã vou-me enrascar para escrever o próximo. Mas já sabem: podem sempre contar comigo para vos desenrascar.

19 de novembro de 2006

A Razão do Capacete

capacete
Há muitas coisas que podem provar que o ser humano não é inteligente. Mas a minha preferida foi a necessidade de inventar o capacete. Aparentemente, o que estava a acontecer é que estávamos envolvidos em muitas actividades que nos estavam a partir a cabeça. Optámos por não deixar de as fazer e, em vez disso, inventar uma coisa que nos permitisse manter o estilo de vida que estava a partir-nos a cabeça. O capacete. Mas nem mesmo isso funcionou, porque havia muita gente que não o usava e então foi necessário fazer uma lei que tornasse o uso do capacete obrigatório. O que é ainda mais estúpido é a ideia de se fazer uma lei que obrigue as pessoas a preservarem um cérebro cujo discernimento é tão pouco que nem sequer tenta impedir que se parta o crânio que o protege.

Jerry Seinfeld

18 de novembro de 2006

17 de novembro de 2006

A Razão do Meteorologista

meteorologista
Há três tipos de indivíduos que nos mentem descaradamente todos os dias: os políticos, os astrólogos, e os meteorologistas. Sobre os políticos já falei largamente neste blog e por isso hoje vou dar-hes descanso (como se eles precisassem...); dos astrólogos falarei noutra oportunidade; detenhamo-nos então nos meteorologistas.
Se há profissão cuja credibilidade depende quase exclusivamente dos caprichos da natureza é a de meteorologista.
Sabemos bem que a natureza é imprevisível, facto que torna a profissão de meteorologista numa das mais ingratas do planeta, por duas grandes razões: se acertam na previsão ninguém lhes liga nenhuma porque é suposto acertarem – é para isso que lhes pagam; se falham, e normalmente falham, são imediatamente gozados com aquela condescendência típica de quem nunca acreditou que iriam acertar. Mas uma coisa é certa: nunca ninguém se aborrece muito com eles. Nunca se viu um meteorologista ser despedido por ter falhado uma previsão.
«O senhor previu uma tempestade tropical e afinal temos aqui um furacão de grau sete. Isto é uma verdadeira irresponsabilidade! Já na passada semana nevou quando a sua previsão era de céu pouco nublado com algumas abertas. É inadmissível. Está despedido!!»
Neste aspecto os meteorologistas apresentam muitas semelhanças com os políticos – há uma espécie de impunidade vigente face às barbaridades que dizem.
Uma coisa que me suscita curiosidade é a progressão de carreira de um meteorologista. Como é que eles sobem de escalão? Provavelmente até têm um daqueles cartõezinhos de handicap, como no golfe. Quem conseguir acertar mais vezes nas previsões vai reduzindo o seu handicap até chegar à presidência do Instituto Nacional de Meteorologia.
Por isso, o momento em que acertam na sua previsãozinha deve ser avassalador. É um ponto alto das suas carreiras. Ficam mais felizes que um tornado num parque de caravanas.

16 de novembro de 2006

A Razão do Espírito de Natal


Sente-se invadido por um sentimento generalizado de paz e harmonia e apetece-lhe comprar duendes de loiça para colocar à porta de casa? Ouve sinos e cânticos por todo o lado, até mesmo quando passa ao lado de mais uma ruidosa greve de milhares de manifestantes da função pública? Tem uma árvore de natal montada e a piscar, imponente, na sala de jantar desde que acabou as férias de Verão? Sonha recorrentemente com figuras de presépio? A sua dieta alimentar é feita à base de peru recheado e bacalhau cozido? As suas compras de Natal deste ano estão feitas e arrumadinhas no armário desde o último Janeiro? Obriga os seus filhos a escreverem cartas a uma figura fictícia que supostamente vive na Gronelândia a explorar duendes e a abusar sexualmente de renas? Sempre que acorda olha para dentro dos seus sapatos para ver se têm alguma coisa lá dentro? Apetece-lhe sistematicamente fazer uma largada de Pais Natal dentro da Assembleia da República?
Então o mais provável é que você precise de ser exorcisado, porque está possuído pelo Espírito de Natal.

13 de novembro de 2006

A Razão do Taxista de Aeroporto

taxista de aeroporto
Para os mais distraídos podem não existir diferenças e parecer tudo a mesma coisa, mas não é. O taxista de aeroporto tem um património genético diferente do vulgar taxista. Algures no processo de evolução do taxista houve um ramo que foi afectado pela síndrome do funcionário público e que ditou o nascimento de uma nova estirpe, com um QI mais modesto, que reúne o pior do que podemos encontrar dentro de um táxi.

O taxista de aeroporto tem particularidades inimagináveis para os taxistas vulgaris. A sua principal característica reside no facto de não conceberem que se possam apanhar clientes fora do aeroporto. É algo que não lhes passa pela cabeça. Para um taxista de aeroporto, os clientes nascem de dentro dos aviões e é absolutamente impensável apanhá-los no meio da rua ou numa vulgar paragem de táxis dentro da cidade. Por isso mesmo, a vida de um taxista de aeroporto reveste-se de um carácter rotineiro onde cada dia começa e acaba, invariavelmente, no terminal de aeroporto.

Ao contrário do taxista vulgaris, o taxista de aeroporto sai do seu carro quando apanha um cliente. Cada início de bandeirada tem um ritual muito próprio que consiste em sair do carro, abrir o porta-bagagens, e ficar especado a olhar bovinamente para o cliente que, de vértebras comprimidas, se esforça a arrastar as suas pesadas malas para dentro do táxi.

Por razões que ainda ninguém conseguiu explicar até hoje, o taxista de aeroporto tem uma obsessão doentia com grandes distâncias, e torna-se ainda mais bruto se a bandeirada consiste apenas em meia dúzia de quilómetros para além do aeroporto. Na óptica do taxista de aeroporto, se um tipo apanha um táxi no aeroporto tem que fazer, pelo menos, uma bandeirada de 300 km que justifique e financie o facto de este ter estado três horas a coçar a micose numa fila de táxis num terminal de aeroporto. Explicar-lhes que, se quiséssemos viajar para 300 km dali mais valia termos voado para outro aeroporto é tempo perdido, porque para um taxista de aeroporto não existe outro aeroporto. Só aquele. O dele.

Outro raciocínio complexo do taxista de aeroporto está relacionado com a dimensão e número de malas que os clientes têm. Para ele, o número e a dimensão das malas estão inexplicavelmente relacionadas com a distância a percorrer: se tivermos muitas malas e grandes é vulgar que o taxista de aeroporto ache que vai percorrer o país connosco; se tivermos apenas uma mala de cabine ele olhar-nos-à com uma desconfiança abrutalhada enquanto cumpre o ritual de abrir o porta-bagagens. Para um taxista de aeroporto ninguém pode ir muito longe com uma mala de cabine.

Ao contrário do taxista vulgaris, um filósofo da bandeirada que nos quer convencer de qualquer coisa o tempo todo embrulhando cada trajecto numa conversa interminável, o processo da fala de um taxista de aeroporto é complexo e está directamente relacionado com a distância que lhe é solicitada para percorrer: se a bandeirada tiver menos de 5 km ele só consegue bufar e abanar a cabeça; se a bandeirada se situar entre os 5 e os 10km ele grunhe pontualmente ao longo do trajecto; se a bandeirada estiver acima dos 10km ele não emite qualquer som, embora apresente uma postura rígida que se assemelha a um cherne com 3 semanas de congelador. Há quem diga que, a partir do quilómetro 50, o taxista de aeroporto consegue pronunciar um conjunto de palavras que se assemelham vagamente a português, mas isto ainda está por provar.

Finalmente, falemos do espírito de matilha. Os taxistas vulgares têm-no. Os taxistas de aeroporto não. A pior coisinha para um taxista de aeroporto é outro taxista de aeroporto. Parado horas intermináveis no terminal, numa fila de táxis, o taxista de aeroporto fixa toda a sua bilis no colega do carro da frente. Com a certeza absoluta que «aquele filho da puta vai apanhar um gajo que quer viajar por Portugal inteiro numa única bandeirada», e que ele inevitavelmente apanhará um cliente para a próxima rotunda. Depois de horas e horas a consumir-se nesta lenga lenga ácida eis que, tenso e prestes a rebentar, se dirige para o cliente que lhe coube na fila e que lhe diz: «É para a próxima rotunda, segunda entrada, se faz favor».
Há vidas muito tristes.

12 de novembro de 2006

A Razão Abrupta

Retratos do trabalho em Taiyuan, China
(isto não interessa para nada, mas aparentemente é intelectual chic)
intelectual chic

11 de novembro de 2006

A Razão de Cabeça Perdida

perder a cabeça
Se alguma vez perder a cabeça espero que alguém honesto a encontre e a entregue nos Perdidos e Achados.

George Carlin

10 de novembro de 2006

A Razão do Insulto Gratuito

insulto gratuito
Por mais incrível que pareça, há malta que não aprecia o insulto gratuito. Ficam chocados com aquilo e reagem mal. Num país onde toda a gente quer tudo à borla, há aqui qualquer coisa que me escapa. Preferem pagar para ser insultados?

9 de novembro de 2006

A Razão Daltónica

daltónica

Quando a Protecção Civil decide lançar um alerta vermelho é bom que tenha consciência que está a meter os daltónicos num belo sarilho.

7 de novembro de 2006

A Razão dos Esquemas

esquema
No que toca a esquemas, os portugueses são imbatíveis. Não há povo no mundo que consiga produzir tanto esquema em tão poucos quilómetros quadrados. Se estão a pensar nos brasileiros, esqueçam: apesar de terem aprendido connosco a arte e de serem mais 140 milhões do que nós, não nos chegam aos calcanhares quando analisamos a quantidade de esquemas per capita.
Tudo o que acontece em Portugal faz parte de um esquema qualquer, iniciado por alguém, para lixar outrem. Quando olhamos à nossa volta, é impressionante a quantidade e variedade de esquemas que diariamente nos passam pela frente. Temos esquemas que chegam todos os dias às páginas do jornais, e quando isso acontece sabemos que se tratam de esquemas mal feitos, porque os esquemas bem feitos e bem montados são como os crimes perfeitos: ninguém os topa.
Estamos tão habituados a viver neste esquema que já não ligamos para a maior parte dos esquemas. É como se fizessem parte do esquema. São os chamados esquemas habituais. Acontecem tão naturalmente como o ar que respiramos e, não alinhar neles, é capaz de nos sufocar.
Temos também os velhos esquemas. Aqueles esquemas bafientos e instituídos que, quando denunciados pela comunicação social, acabam por se tornar esquemas manhosos e são substituídos por esquemas mais modernos.
A dimensão dos esquemas também é importante nesta telenovela mexicana: normalmente quem está envolvido em grandes esquemas e é apanhado, goza de uma espécie de glorificação bacoca e sai normalmente impune do esquema – o que leva a crer que há uma espécie de respeito e admiração velada e boçal por quem é um grande esquemático. Aqui, neste rectangulozinho, é prestigiante enganar muita gente. Ao contrário, o pequeno esquema (também designado por esquemazinho) é altamente penalizado. O lema parece ser «se roubares, rouba com estilo e em grande».
Temos finalmente uma classe de esquemas que parecem estar directamente relacionados com a necessidade de protagonismo mediático que os portugueses de classe média têm vindo a desenvolver na última década: são os esquemas marados (também designados por esquemas dos caraças). O objectivo destes esquemas é dar nas vistas, tentando assemelhar-se aos grandes esquemas, numa tentativa vã e desesperada de poderem ser considerados inteligentes, com o decorrente prestígio que daí advém. É claro que isto só denota a estupidez atávica de quem os cria – é tido e sabido que um esquema, para ser grande, tem que ser acima de tudo muito discreto. E os esquemas marados têm invariavelmente a discrição de um elefante numa loja de cristais...
Estão a ver o esquema?

4 de novembro de 2006

A Razão dos Avisos de Cabine

avisos de cabine
«Senhoras e senhores, o avião está a estabilizar e, em breve, atingiremos a velocidade de cruzeiro. Isto quer dizer que o pessoal que está no cockpit vai descontrair e fumar umas coisas que trouxeram do Havai. Depois de umas seis passas, desligam o piloto automático, tiram as mãos dos comandos e deixam o avião fazer o que entender durante uns minutos. O comandante sugere que mantenham os cintos de segurança apertados a não ser que tenham uma vontade muito grande de ficar com um traumatismo craniano.
O comandante acaba de desligar a luz de obrigatoriedade de manter os cintos apertados. Foi sem querer. O charro que estava a fumar caiu-lhe no colo, e quando se levantou, bateu com a cabeça no botão.
O comandante desligou a luz de obrigatoriedade de manter os cintos apertados mas avisa que é melhor manterem-se atentos porque, às vezes, estes aviões não funcionam tão bem como desejável.
O comandante ligou a luz de obrigatoriedade de manter os cintos apertados outra vez. Também acaba de enfiar meio quilo de nozes pelas narinas acima. Por isso, é melhor serem vocês a decidir o que querem fazer com os cintos.»


George Carlin

1 de novembro de 2006

A Razão da Secessão

Secessão

Até aos vinte anos, pelo menos, acreditei que a Guerra da Secessão era apenas um erro de revisão.


Millôr Fernandes

31 de outubro de 2006

A Razão dos Gases

gases
Portugal é um dos sete países da Comunidade Europeia que não vai cumprir os objectivos de Quioto no que respeita à emissão de gases para a atmosfera. Pelos vistos estamos a emitir mais gases do que aqueles que prometemos aos senhores. Tenho dificuldade em perceber porquê, por várias razões:
O sector primário do país é praticamente inexistente, e portanto se as debulhadoras mecânicas e os tractores andam cada vez mais parados, não é lógico que os gases aumentem.
Por outro lado, no sector secundário, só vemos fábricas a encerrar, uma após outra. Ora se há cada vez menos fábricas a operar no território nacional, seria lógico pensar que a emissão de gases diminuiria face à década anterior.
No sector dos transportes, outro grande responsável pela emissão de gases, temos cada vez mais greves públicas. Ora se é raro os transportes públicos funcionarem em pleno neste país, seria mais uma vez lógico, que menos gases fossem emitidos.
Podíamos até culpar os automobilistas, mas desde há 4 anos que observamos uma queda na venda de automóveis em Portugal, portanto também não é por aqui.
Por tudo isto não percebo de onde surge este acréscimo de gases. Só vejo duas possibilidades:
1. Andamos todos a apertar demasiado o cinto e inevitavelmente mandamos os gases todos cá pra fora.
2. Temos cada vez mais flatos sem cheiro a fazer política em Portugal.
Das duas, uma. Ou duas.

30 de outubro de 2006

A Razão das Causas

causas
Se há coisinha que eu acho mesmo nobre é uma bela causa. Lutar por uma causa é uma coisa mesmo bonita, principalmente quando olhamos para o tipo de causa. Vejamos, por exemplo, aqueles indivíduos que lutam por causas perdidas. Não é bonito? Não é romântico? Não é patologicamente estúpido? Lutar por algo que não se sabe onde está requer uma certa dose de alheamento da realidade e de um prazer mórbido em nunca chegar a lado nenhum. É bonito.
Também acho piada ao lado estético das causas: são as chamadas boas causas. E sabe Deus como há causas boas como o milho...
Mas o tipo de causas que mais aprecio são as causas maiores. Haverá causa mais nobre do que a causa maior? Duvido. Não há causa que despolete mais efeito que a causa maior. Principalmente aquelas mesmos grandes, acima do metro e oitenta. Aquilo é causa que nunca mais acaba. Tem uma extensão tão sublime que por vezes, para muito boa gente, até se confunde com as boas causas.
Já as causas menores dispenso: considero-as quase invariavelmente uma espécie de pedofilia intelectual.

28 de outubro de 2006

A Razão da Parvoíce

parvoice
Porque não ser parvo? Um parvo praticante e diplomado. Ou, se tiver competência para isso, um PPE, Parvo Público Encartado. Pode não parecer quando olha à sua volta, mas não há parvos que cheguem no nosso país. Como resultado disso, pode ganhar-se muito dinheiro com a parvoíce. O parvo médio ganha pipas de massa por ano, mais regalias. E há vagas para parvos em todos os sectores: o governo é gerido por parvos, as grandes empresas são geridas por parvos e o comércio está a abarrotar de parvos. E cada vez mais pessoas enveredam por uma carreira de parvo freelancer. Ligue já para o Instituto Técnico da Parvoíce e receba o nosso panfleto gratuito «Ei, parvalhão, aprende a ser parvo a sério!» A maior parte das pessoas consegue ser parva em festas mas esta é a sua oportunidade de ser um parvo a tempo inteiro e durante todo o ano. Ligue-nos. Não se faça de parvo, seja um parvo.

George Carlin

27 de outubro de 2006

A Razão dos Seres Superiores

seres superiores
Na Alemanha rebentou uma escandaleira que envolve um grupo de soldados alemães que fazem parte do contingente da ONU no Afeganistão. Os soldados deixaram-se fotografar posando alegremente para a câmara com um crânio numa mão e um pénis na outra. Os media alemães, para não enervarem os sempre enervadinhos árabes, dizem que os soldados profanaram um cadáver de um soldado russo, morto em combate nos anos 80. Confesso que não percebo como é que um cadáver de um gajo que morreu há quase 20 anos apresenta um crânio completamente desprovido de carne e um pénis não decomposto, mas desconfio que se deve a algo que os russos punham na ração de combate dos seus soldados.
Mas o que realmente interessa nesta história não é o mistério da mumificação selectiva e sim a violenta reacção dos orgãos oficiais alemães, ao questionável comportamento dos seus soldados. A reacção mais preocupante vem de um senhor que foi antigo comandante da ISAF e que afirma que «a imagem positiva que os militares alemães sempre gozaram junto das populações locais poderá ser seriamente afectada».
Quando leio estas coisas só posso achar que, de facto, estes gajos continuam a ser os maiores caras-de-pau da Europa e que o seu recorrente complexo de superioridade teima em vir ao de cima. Esta malta esquece-se do que andou a fazer na Europa há duas gerações atrás. Esta gentalha acha que, 50 anos depois, toda a gente apagou da memória a «imagem positiva dos militares alemães», e a sua conduta selvagem e criminosa. Estes calhordas acham que, por os deixarem andar de armas na mão, a fazer parte dos contingentes da ONU, reabilitaram a sua imagem no mundo. Desenganem-se. Eu não me esqueço de vocês. E espero que o mundo também não.

Foto: Vala comum em Bergen-Belsen, depois da interacção social da população local com os militares alemães.

26 de outubro de 2006

A Razão da Hiperactividade

hiperactividade
A hiperactividade é uma coisa que não existia há uma geração atrás. Havia putos energéticos, imparáveis e cansativos. Mas não eram hiperactivos. Hoje em dia, um em cada 2 filhos dos meus amigos são hiperactivos. E ser hiperactivo consiste em fazer a maior merda possível no mais curto espaço de tempo. Os putos hiperactivos são, na realidade, uns espertalhaços e os seus pais uns grandes bananas.
Se alguém que está a ler isto acha que tem em casa um filho hiperactivo, não tenho grandes notícias para lhe dar: não há filhos hiperactivos! Pois é queridos, não há. Assim como não há homens impotentes mas sim mulheres incompetentes, na questão dos filhos com hiperactividade a dialéctica é parecida. Não há filhos hiperactivos mas sim pais sem a capacidade de ensinarem aos seus filhos as regras basilares da vida em sociedade, bem no seu início. Os putos hiperactivos são, nada mais nada menos, que um eufemismo pretensioso para definir crianças mal educadas, impertinentes, futuros adultos secantes que, naquele momento inicial das suas vidas como seres humanos, apresentam graves sintomas de má educação.
A cura da hiperactividade não reside nas escolas especiais para hiperactivos. Isso é apenas um expediente de uma boa dúzia de mamões para enganar uns papás que já são diariamente enganados pelo seu filho «hiperactivo». A verdadeira cura da hiperactividade resume-se num bom par de chapadas no momento certo, e o resto é conversa.

24 de outubro de 2006

A Razão da Expectativa

expectativa
Lembram-se do Fernando Mamede? Aquele meio-fundista que corria que se fartava? Durante 6 anos seguidos o Mamede parecia imparável e arrebanhava tudo por onde passava: foi detentor de 27 recordes nacionais, de 1 recorde mundial, e de 3 recordes europeus. Até que um dia, algures nos finais dos anos 80, o Mamede ficou com medo de ganhar, e nunca mais ganhou nada. Desde então, sempre que entrava em competições importantes, numa posição de favorito, o Mamede stressava com a possibilidade de não corresponder às expectativas. E stressava tanto que as pernas deixavam de lhe obedecer.
Portugal faz-me lembrar o Mamede: durante séculos corremos que nem uns desvairados a descobrir e a povoar, mal e porcamente, os quatro cantos do mundo. Fizemo-lo com a inconsciência alarve da necessidade. E um belo dia, quando quisemos encontrar o nosso lugar no mundo, stressámos. Stressámos com o facto de sermos apenas um rectangulozinho no fim da Europa, como se alguma vez o tivéssemos deixado de ser, ou como se aqui fosse o fim da Europa. Stressámos com as expectativas que criámos para nós próprios. E desde altura parecemos uns Mamedes, de pernas bambas, governados por uns Mamões.
Continuo à espera da geração de Obikwelus que, paradoxalmente, tarda em chegar.


Nota: Uma Sandes de Atum fez ontem anos. Vão lá dar os parabéns ao Papo-Seco que há dois anos nos anima os Sábados, às Sextas.

22 de outubro de 2006

A Razão Iconoclasta

iconoclasta
Nunca vi ninguém a limpar uma igreja. Já tenho visto muita coisa mas nunca vi uma equipa de limpeza a trabalhar numa igreja, a aspirar e a varrer. A limpar o pó às imagens e a esfregar o altar. Sabem porquê? Consegui perceber o motivo. As igrejas não precisam de ser limpas porque Deus trata disso. É um milagre, o tipo de coisas que faz das igrejas, igrejas.
Funciona assim: depois de uma igreja ter sido construída, os proprietários esperam seis meses e espreitam lá para dentro. Se estiver limpa, ficam a saber que é uma igreja. Depois, é só preparar a grande inauguração. Desse dia em diante, nunca mais terão de a limpar. Não importa o tipo de lixo, imundície ou porcaria que os pecadores arrastem lá para dentro. O sítio fica sempre impecável. Mas, aqui entre nós, um bocado de limpa-vidros naqueles vitrais de vez em quando não fazia mal nenhum. Ajudava a realçar aquelas cores bonitas que usam para mostrar a tortura e o sofrimento dos santos.

George Carlin

21 de outubro de 2006

A Razão da Governação

governacao
O maior problema - um dos maiores problemas, pois há muitos -, um dos muitos maiores problemas da governação é quem se arranja para a fazer; ou antes, quem consegue convencer as pessoas a deixarem alguém fazer-lhes isso.
Resumindo: é bem sabido que as pessoas mais empenhadas em governar são, ipso facto, as menos capazes para o fazer.
Resumindo o resumo: aquele que consegue ser feito governante, não devia, de modo algum, ser deixado exercer o cargo.
Resumindo o resumo do resumo: as pessoas são um problema.
E a situação que encontramos é a seguinte: uma sucessão de dirigentes que gostam tanto de pândega e conversações decorrentes do poder que muito raramente reparam que não o têm.
E algures nas sombras – quem?
Quem poderá governar, se aqueles que nisso se empenham não o devem fazer?


In, O restaurante no fim do Universo, de Douglas Adams

20 de outubro de 2006

A Razão da Alegria da Taberna

alegria da taberna
Sócrates:
Agora imagina como se encontra o estado da nossa nação, relativamente à consciência social. Imagina funcionários públicos numa taberna que improvisaram de maneira a transformar aquilo num local de atendimento ao público. Esses funcionários estão ali desde que acabaram a pré-primária, impedidos de saír da taberna vá-se lá saber porque razão. Não fazem a mínima ideia do que estão ali a fazer, nem se mostram grandemente preocupados com isso. Perfilados atrás do balcão, os funcionários públicos estão todos virados para o mesmo lado: a imponente montra da taberna, em vidro fosco. Conseguem aperceber-se que existe vida para além do vidro fosco - vultos passam por lá todos os dias a toda a hora, mas os funcionários públicos não fazem ideia do que são os vultos, até porque que não fazem ideia de que existem pessoas para lá do perímetro da taberna. Consegues imaginar isso?

Glauco:
Sim, consigo. Desde que fui atropelado por 20.000 professores que se manifestavam pelas razões mais absurdas, consigo imaginar tudo. Até uma tribo somali.

Sócrates:
Imagina agora que, do outro lado do vidro fosco, no mundo real, na rua da taberna, estão pessoas que contribuem mensalmente para alimentar aqueles indivíduos especados dentro da taberna, alinhadinhos atrás do balcão, a olhar para o vidro fosco.

Glauco:
Pagam-lhes mensalmente para estar dentro da taberna a olhar para um vidro fosco?

Sócrates:
É verdade. Pagam-lhes para isso e pagam-lhes uns copos. E aí é que a coisa se complica de sobremaneira, porque quando estão com uns copitos a mais, os funcionários atrás do balcão começam a imaginar coisas esquisitas em relação aqueles vultos que passam no vidro fosco. E depois enervam-se muito e manifestam-se, e fazem greves, e reinvindicam merdas.

Glauco:
Fazem greve de quê, se na realidade não estão lá a fazer nada?

Sócrates:
Bem observado. A questão é que eles não sabem que não estão lá a fazer nada. Aquele é o seu pequeno universo. Não fazem ideia que estão enfiados numa taberna situada numa rua movimentada.
Agora imagina se lhes tirassem o vidro fosco e lhes pusessem um daqueles espelhados, que só se vê de dentro para fora?


Glauco:
Bem, nesse caso eles seriam obrigados a tomar consciência que existem pessoas para além daquela taberna.

Sócrates:
Imagina agora que para além do vidrinho último modelo, lhes abrem a porta da rua e obrigam os gajos a atender toda aquela malta que anda lá fora e que lhes paga os copos. Não desviarão eles os olhos, acreditando que tudo aquilo é uma perfeita mentira e que na realidade o melhor é terem o vidrinho fosco e a porta fechada?

Glauco:
Sem dúvida. Mas onde queres chegar com esta conversa, por Zeus?

Sócrates:
Estava só a tentar chegar à conclusão se vale a pena estarmos a perder tempo com estes tipos. Se o melhor não era contratar uma equipa de demolição que arrasasse a taberna de uma vez só, com os gajos lá dentro.

Glauco:
Certamente mestre. Seria uma alegria.


A República dos Bananas, de Humor Negro (Livro VII)

18 de outubro de 2006

A Razão sem Razão


Para mimar os leitores deste blog, o livro da Razão terá um pré-lançamento online no dia 25 deste mês. Isto significará que quem quiser pagar para ler aquilo que sempre teve à borla poderá adquirir o livro uma semana antes dele sair para o mercado editorial. Mas os mimos não acabam aqui: quem encomendar o livro online (no pré-lançamento e depois dele) verá chegar a sua casa uma cópia autografada. Quem é amigo, quem é? Tentei negociar com a editora que os livros fossem entregues em mão pela Nicole Kidman, envergando vestes reduzidas, mas não havia orçamento para isso. Portanto ficam-se só pelo autógrafo e já gozam.
Depois do pré-lançamento poderão, ainda assim, comprar o livro online, bastando para isso clicarem aqui e fazer a encomenda. Para aqueles que não gostam de usar o cartão de crédito em compras online, uma boa notícia: não vão ter essa hipótese.
E por hoje chega de mimos.

15 de outubro de 2006

A Razão Suicida

suicida
Há uma coisa que eu não percebo nas pessoas com tendências suicidas. Tentam suicidar-se, por qualquer razão não conseguem morrer, e pronto. Deixam de tentar. Porque é que não continuam a tentar? O que é que mudou? A sua vida terá melhorado? Não, deve ter piorado, porque agora têm mais uma coisa em que falharam. E, para começar, é por isso que essas pessoas não têm sucesso na vida. Desistem com demasiada facilidade.
A minha sugestão é: os comprimidos não funcionam? Experimentem uma corda. Não conseguem pôr o carro a trabalhar na garagem? Mandem afinar o motor. Não há nada mais compensador do que atingir um objectivo que fixámos para nós próprios.


Jerry Seinfeld